quarta-feira, 30 de abril de 2008

o descaso.


"I'll dream alone without you
I'll dream alone if I must
because I guess our little castle
in the sky just turned to dust
So I'll dream alone that's showbiz"




Eu tenho, as duras penas, reaprendido a ser só. Me levo para passear, me faço companhia, até arrisco me dar conselhos e pedir calma de vez em quando, é bom pra lembrar que quando eu quero e eu me ouço, eu consigo ser de fato meu melhor amigo e um bom conselheiro. É irônico que eu só recorra a mim mesmo em momentos extremos de solidão, e mais irônico ainda quando ouso dizer que meu maior medo é o de ser deixado para trás, esquecido, ficado perdido no passado das pessoas que insisto que permaneçam assombrando o meu presente e zombando da minha saudade.

É, nesses dias eu tenho chorado muito e gargalhado só, mudo de atitudes o tempo todo, parece que eu sofro algum tipo de transtorno bipolar (coisa que de certa forma sempre tive), mas é admirável pensar que quando entro em completo desespero, minha mão esquerda puxa a direita e ergue meu corpo do chão enquanto eu digo - calma amigo, você precisa se controlar e ter paciência - coisa essa que eu definitivamente não tenho, para em menos de dez minutos eu cair e me levantar de novo.

Sei que devo controlar minha impulsividade e meu desespero, mas eu tenho um orgulho velado dessa atitude que me sinto coagido a confessar aqui. É engraçado como existem mil filmes sobre pessoas como eu pelo mundo, seja Alice, Clementine, ou Holly, no final das contas nós só somos bonitinhos em filmes, atrás da tela, mas no fim das contas, as pessoas se cansam dessa alma de fênix, dessa auto-destruição que nos leva as cinzas e delas nos ergue. De modo que no final, elas vão embora e nos restam duas opções; ser deixado na poeira ou varrer o pó.




So, what's it gonna be?

quarta-feira, 23 de abril de 2008

o silêncio.

Hoje andei sem destino, até perceber que o meu destino é esse, andar sem destino. É coisa que faço desde sempre, brinco de correr riscos, cruzar becos escuros, me perder, como se de alguma forma eu fosse me achar num breu qualquer.


what should I do to show how empty I usually fell? Well, most of the times, I just shut my mouth...

segunda-feira, 21 de abril de 2008

my blueberry nights

Hoje fui ai cinema e saí com a sensação de que o filme acabou cedo. Fui rezando pro filme ser bom, o suficiente para me levar as lágrimas, me fazer chegar a uma espécie de catarse que me fizesse canalizar um monte de sentimentos indefinidos que mais me parecem irracionais, mas o coração tem razões que a própria razão desconhece, já dizia Medéia, personagem com a qual tanto simpatizo. Na minha vida vi e vivi minha mãe ser mais uma Joana do dia-a-dia, mas um pouco pior que a original, ela foi Joana daquelas, que chega ao extremo de colocar o veneno mortal na boca e vomitar logo em seguida, porque no fim do dia, ela ainda tinha dois filhos pra criar, contas a pagar, dessa vez sozinha, e uma vida pra levar. E foi assim, puxando a minha mãe, que repeti o fado de ser Joana pela metade, aquela que morre sem morrer e continua de pé, porque nada dói mais que superar. Superar requer deixar pra trás amores de amora, os mais doces sonhos e planos, emfim... se deixar pra trás. Como dizia Vinícius, o amor é a coisa mais triste quando se desfaz. Ai a gente vai levando a vida em nostalgia, em lembranças guardadas na memória, e para tudo parecer mais poético, ouvindo bossa nova.


Mas como na vida real, não tem Dr. Howard Mierzwaik, nem magia, nem carro de fogo pra apelar, dessa vez, só pra variar, eu espero que o final seja diferente, mesmo que venha a tocar o "B sides" do Damien Rice de vez em quando, espero acabar o dia ouvindo lobo bobo, canta, pede, promete tudo, até amor, e diz que fraco de lobo, é ver um chapeuzinho de maiô...

terça-feira, 8 de abril de 2008

vento no litoral

Choveu por toda a madrugada, a manhã custou a nascer, e de fato quando o dia raiou, foi como ver um tom acinzentado clarear, era outono e as folhas que ainda não tinham caído das árvores estavam cheias de pingos de orvalho. No caminho para a praia, caiam na minha cabeça as gotas que o vento derrubava dos galhos, eu não levei guarda-chuva porque saí sem medo de me molhar. Vestia uma bermuda caque e um casaco esverdeado meio musgo. Ao redor do meu pescoço, trazia um longo cachecol branco de tricô que você esqueceu, e meus pés andavam descalços, de modo que a areia da estrada molhada colava entre meus dedos dos pés. Não tinha problema, eu saí sem a intenção, mas ia lavá-los no mar.
Andei pensando naquela maldita canção que eu costumava adorar antes de não sair da minha cabeça; cantarolava "I Wonder" pela milésima vez. Era bom tirar férias da vida de vez em quando. Eu sentia alívio e mágoa de ter sido abandonado, mas depois de desidratar litros chorando o leite derramado, eu parecia bem mais sereno seco. Acho que depois que as coisas aconteceram, ví que não adiantava mais chorar, e eu até me sentia meio estúpido, meio babaca em pensar em como consigo ser absurdamente passional. Caminhei uns 200 metros quando finalmente a vista do horizonte do mar surgiu e começou a subir na minha frente, o barulho crescente das ondas trazia uma certa paz que embalava a minha solidão nos braços, me fazendo uma espécie de companhia paradoxalmente confortante.
Naquele momento meu casaco era minha maior proteção, e eu percebi porque toda vez que saía na rua tinha que levar uma mochila ou algo assim, para que me servisse de escudo no meio da multidão. De certa forma dessa maneira eu me sentia menos vulnerável. Hoje me lembro que quando menino eu dava nome de gente aos meus objetos favoritos; o ursinho de pelúcia era Zé, e o cobertor era João, o meu guardião. De qualquer maneira eu não era mais criança e recordar isso aquele dia me deixou desconfortável, era como se eu tivesse deixado cair meu casaco no chão.
Quando cheguei na praia deserta, pude ver um esboço de arco-íris se formar no céu, era pequeno e suas cores estavam meio desbotadas. Ainda assim lembrava diversos desenhos que pintei em aquarela quando pequeno. É, as memórias de infancia persistiam em aparecer, acho que talvez porque criança não precisa encarar o futuro sem sonho, sem perspectiva. Essas morreram junto com você.
Mas engana-se se achas que essa narrativa morre aqui, ela reflete o que sobrou de mim e que serventia eu poderia me dar, e embora eu tivesse todo aquele dia sem compromisso com as horas diante do mar, eu não consegui achar a resposta. Eu até me esforcei procurando sabe? Mas parece que eu me distraia com cada pássaro que cruzava o ar, ou luzes de barco que piscavam no horizonte. Novamente quando era menino, eu morria de medo que os barcos despencassem verticalmente, como numa cachoeira, mas o mundo tomou uma perspectiva muito mais interessante quanto eu aprendi que ele é redondo, e que aquele horizonte, embora parecesse um fim, era só o começo da jornada, e viajei numa de que todo fim é um começo, cada barco que chega no horizonte, ainda tem um outro horizonte para cruzar e um montão de mar pra atravessar, e eventualmente do outro lado, vai ter terra firme para ancorar.
É, eu não consegui traçar planos, nem sei muito bem que lição aprendi, mas acho que o que não adianta é parar de navegar, que nadando em frente, a gente chega em algum lugar.

terça-feira, 1 de abril de 2008

empty glass full of water

Mariana acordou aquela manhã, como em todas as outras, pensando que embora não tivesse sono, não queria levantar. Olhou fixamente o teto de seu quarto por alguns minutos, quando a claridade começou a tomar forma, suspirou fundo e finalmente fincou os pés do chão, procurando no sinteco suas sandálias de algodão. Usava uma velha camisola branca de linho com detalhes bordados nas extremidades, vinda de uma famosa loja de Paris, na época em que Paris era Paris, que ganhou na festa de seu casamento quarenta e dois anos atrás em um casarão no velho Humaitá, que vivia em suas memórias em Sépia. Era manhã de Júlio na serra, onde vivia há quase trinta anos e o frio batia na espinha, então pegou no cabideiro de magno o pullover rosa claro e salmão, bordado por ela mesma, assim como quase todos os outros tecidos da casa. Bordar era um dos passatempos que mais gostava, pois engavana as horas. Passando pela janela, caminhou até a penteadeira, pegou a escova dourada semi-enferrujada que herdou de sua falecida avó e foi aos poucos desembaraçava os longos fios loiros ondulados, que embora enbranquecidos e secos pelo tempo, continuavam belos e imponetes. A cada escovada, Mariana passava a se enxergar atenta no espelho a frente, em suas mãos manchadas com pequenas marcas do sol, saltavam grandes veias azuis. Sua pele fina e flácida, seu pescoço era longo e em sua face estavam tatuadas as marcas de expressão que esboçou durante sua vida, as rugas marcavam da boca aos cantos dos olhos, que suavemente passou a encarar. Seus olhos eram azuis, e esses ainda conservavam sua forma e cor, embora esboçassem uma friesa enigmática. Seu olhar curioso a questionava sem saber o que perguntar e do outro lado do espelho respondia sem saber o que declarar, e se olhando nos olhos não conseguiu se enxergar. Como quem insiste por uma resposta foi focando a vista em seus olhos, que perderam embaçados perderam a definição e a forma. Sentiu mergulhar e caiu com suas mãos no chão em um corredor de altos muros de hera, seus pés pisavam em areia fina e clara, e sob sua cabeça brilhavam estrelas num céu que diria preto, se não soubesse que era azul. Olhou assustada ao seu redor e tinha apenas dois caminhos a seguir, o de trás ou o da frente. Desesperada para sair dali, escolheu o caminho da frente por não gostar de voltar e do que pode encontrar no caminho de volta, foi caminhando pé ante pé em frente, buscando inúltilmente em sua frente uma luz que indicasse a saída. Depois de muito andar o corredor deu-se em outro corredor mais curto a esquerda, e outro corredor, e mais outro com dois caminhos, escolheu o da direita e percebeu que alí não havia saída. Sentiu-se presa e um nó desceu um sua garganta ao virar o pescoço, e viu que era necessário voltar. Saiu do corredor com o coração a mil, sentia a mão trepidar e no corredor anterior apressou o passo para o caminho da esquerda, quando percebeu que esse também parava em uma parede de hera. A primeira lágrima caiu dos seus olhos sem nem piscar, e dessa vez ao voltar, girou em círculos, tentou empurrar as paredes, e fez menção de gritar, mas sua voz não saiu. Impotente, correu querendo deixar em seus rastro suas angústias, e foi cruzando corredores e corredores, tendo que voltar outros tantos corredores já percorridos e sem saída, correu cada vez mais rápido buscando liberdade em sua prisão, continuou desesperadamente até dar no que parecia ser o centro do labirinto que dava não para dois, mas para uns quarenta corredores de hera, em seu centro estava uma fonte de pedra. Sem pensar, sem saber o motivo ou o que fazer sentou-se fatigante em sua beirada e olhou de relance até contemplar, a água que movia lentamente em aros que se abriam com o cair de uma gota de suor ou lágrima, refletir o céu, as estrelas, a lua que iluminava seu rosto, suas marcas, seu olhos, e parou em um olhar de espanto enigmático. Suas pupilas curiosas a questionavam sem saber o que perguntar e respondiam no reflexo sem saber o que declarar, e se olhando nos olhos não conseguiu se enxergar. Sua vista ficou sem foco e quando deu por sí, estava onde nunca havia saído, sentada em frente a sua penteadeira, penteando os cabelos e fitando em seus olhos uma angústia sem resposta, uma curiosidade enigmática.